Condomínios do Funchal em revolta: Assembleia extraordinária aprova por larga maioria proibição total de novas licenças de alojamento local. Moradores queixam-se de ruído, sobrelotação e desvalorização dos imóveis.
FUNCHAL, 15h30 - Uma assembleia de condomínio extraordinária realizada ontem à noite no prestigiado Edificio Varandas terminou com a aprovação unânime da proibição de novos registos de alojamento local. Os moradores, fartos do "inferno diário" causado pelos turistas, ameaçam avançar para tribunal se os proprietários não cumprirem.
FUNCHAL - Os moradores do Edificio Varandas, localizado numa das zonas mais valorizadas do Funchal, aprovaram por unanimidade, em assembleia extraordinária realizada na terça-feira à noite, a proibição de novos registos de alojamento local no edifício.
A decisão surge depois de meses de queixas relacionadas com ruído excessivo, sobrelotação das áreas comuns e comportamentos inadequados por parte dos hóspedes das 24 unidades de alojamento local que funcionam no prédio de 60 apartamentos.
"Não aguentamos mais. Isto tornou-se um hotel sem regras", disse Ana Sousa, moradora há oito anos, à saída da assembleia que durou mais de três horas.
Segundo apurou o JM, o conflito no Edificio Varandas intensificou-se nos últimos meses, particularmente durante a época alta do Verão, quando o número de hóspedes aumentou significativamente.
"Há apartamentos que recebem grupos de 8 a 10 pessoas. Fazem barulho até às 3h da manhã, deixam lixo nos corredores e usam a piscina como se fosse uma discoteca", queixa-se João Silva, proprietário de um apartamento no 4º andar.
"Os meus filhos já não conseguem estudar em casa. O barulho é constante. Estamos a pensar mudar-nos."
— Maria Costa, mãe de dois filhos, 3º andar
"A piscina está sempre ocupada por turistas. Já nem vamos lá. Pagamos condomínio para quê?"
— Carlos Mendes, reformado, 2º andar
O administrador do condomínio, contactado pelo JM, confirmou que recebeu "dezenas de queixas formais" nos últimos seis meses, principalmente relacionadas com perturbação do sossego e uso abusivo das instalações comuns.
A assembleia extraordinária, convocada a pedido de mais de metade dos condóminos, contou com a participação de 45 dos 60 proprietários, representando 75% das fracções.
Votação: 42 votos a favor, 2 contra e 1 abstenção. A maioria qualificada de dois terços foi largamente ultrapassada.
Contactados pelo JM, vários proprietários de unidades de alojamento local mostraram-se surpreendidos com a decisão e prometem contestá-la judicialmente.
"Temos licenças válidas emitidas pela Câmara Municipal. Não podem simplesmente proibir uma atividade legal. Vamos recorrer aos tribunais."
— Fonte ligada aos operadores de AL (sob anonimato)
Segundo a mesma fonte, os proprietários de alojamento local investiram "milhares de euros" na adaptação dos apartamentos e consideram a decisão do condomínio "ilegal e abusiva".
Segundo o advogado especialista em direito imobiliário Ricardo Pereira, contactado pelo JM, "a assembleia de condóminos tem poder para estabelecer limitações ao uso das fracções, desde que aprovadas por maioria qualificada".
O caso deverá ter seguimento nos tribunais, podendo criar jurisprudência para situações similares noutros condomínios da Madeira.
O caso do Edificio Varandas não é isolado. Segundo dados da Câmara Municipal do Funchal, existem actualmente mais de 3.200 unidades de alojamento local registadas na cidade, sendo que 78% estão localizadas em edifícios de habitação multifamiliar.
Helena Soares, economista especializada em turismo, considera que "era inevitável chegar a este ponto". "O crescimento descontrolado do alojamento local criou uma bolha que agora está a rebentar", explicou ao JM.
O administrador do Edificio Varandas confirmou que as novas regras entram em vigor "imediatamente" e que já foram notificados todos os proprietários de unidades de alojamento local.
O JM continuará a acompanhar este caso e os seus desenvolvimentos nas próximas semanas.
A redacção do JM continua a investigar este caso. Se tem informações adicionais ou quer partilhar a sua experiência, contacte-nos.